Corrupção na construção da usina de Itaipu pode ter motivado a morte do embaixador José Jobim

O Instituto João Goulart encaminhou no final de novembro denúncia ao Ministério Público Federal do Rio de Janeiro sobre a suspeita de que o embaixador José Jobim foi assassinado por agentes da ditadura militar em março de 1979.

Foto: Reprodução

Poucos meses antes de sua morte, o embaixador declarou para políticos em Brasília que escrevia suas memórias em que denunciaria o esquema de corrupção na construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu.

José Jobim foi sequestrado em frente à sua casa em 22 de março de 1979. Dois dias depois, seu corpo foi encontrado no bairro do Cosme Velho, na cidade do Rio de Janeiro. Segundo a investigação do delegado Rui Dourado, Jobim se enforcou com uma corda. A hipótese é refutada pela filha do embaixador, a advogada Lygia Jobim, que busca a verdade sobre a morte do pai há 35 anos.

O documentário Itaipu, a quem interessa e escuridão? fornece mais informações sobre o possível assassinato do embaixador: 

Em 1964, José Jobim foi enviado pelo presidente João Goulart ao Paraguai para acertar junto ao governo daquele país a compra de turbinas russas. José Jobim foi um diplomata experiente com longa carreira no Itamaraty e ocupou cargos nas embaixadas da Colômbia, Vaticano, Argélia e outras. Após o golpe civil-militar de 64, o consórcio brasileiro e paraguaio responsável pela obra cancelou as negociações com os russos e comprou equipamentos da multinacional Siemens. O projeto ‘Sete Quedas’ de João Goulart, orçado em 1,3 bilhão de dólares, foi substituído por outro que custou dez mais, R$ 13 bilhões de dólares.

O primeiro presidente da Itaipu Binacional foi o militar Costa Cavalcanti da linha dura entre os golpistas. Ele conspirou contra Jango, considerava branda a posição política do general Castello Branco e foi um dos articuladores da candidatura de Costa e Silva à presidência. Votou a favor da implantação do AI-5 em 13 de dezembro de 1968, na época, ocupava o cargo de ministro de Minas e Energia.

Por pressão do governador do Rio de Janeiro, Leonel Brizola, as investigações sobre a morte de José Jobim foram reabertas em 1983. A promotora Telma Musse Diuana foi designada para cuidar do caso e solicitou novas investigações à polícia, baseando-se na “dubiedade do laudo que concluiu pelo suicídio”. Um inquérito foi finalmente instaurado, o qual considerou os fatores da morte do embaixador “todos incompatíveis com a hipótese adotada pelos legistas oficiais”. O processo acabou arquivado em 1985, sendo a morte de Jobim qualificada de “homicídio por autor desconhecido”.

Depoimento de Lígia Jobim

‘1979-2014 – Foram necessários 35 anos para que meu pai – JOSÉ JOBIM – tivesse sua dignidade de volta. Foi encontrado morto, pendurado numa árvore, seu corpo marcado por sevícias e suas roupas sujas de sangue. Foi interrogado sob tortura para dizer quem lhe passava as informações, que estava prestes a divulgar, sobre a corrupção em Itaipu. Devem ter achado que sua morte o tornava – e a nós – em vencidos. Não perceberam que vencidos foram eles que perderam a condição de seres humanos ao se deixarem dominar pela bestialidade. Lamento por seus filhos… De cachorro morto em beira de estrada a vítima da sórdida e boçal ditadura militar que dominou o país por 21 anos, o caminho foi longo. Não quero, nem posso, não agradecer àqueles cujo apoio foi de imensa importância para mim na fase final de mais uma etapa, e que não será a última. Acreditem que cada curtida foi um abraço, cada compartilhamento a certeza de que esse alguém não quer que o país viva novamente o arbítrio. Muitas vezes me perguntam por que tanta tenacidade. A resposta é simples: meu pai, como os Aézios, Amarildos e o Brasil merecem respeito. Nos últimos meses o incentivo maior foi o apoio de meus filhos e seus amigos. O apoio dessa juventude reforçou em mim a convicção de que minha esperança num futuro mais digno possa se concretizar. Meninos, quero que saibam que parte do que fiz foi por vocês. E também pelas Marinas, Henriques, Marias e Lucas, Tomás, Júlias, Pedros, e Erics, sem faltar minha Isabel Liz e Dom Alba. A lista de agradecimentos seria infindável, mas não posso deixar de destacar a CNV, na pessoa do Ministro Antonio Mesple, o Instituto João Goulart, nas pessoas de João Vicente e Verônica. À Carolina Cooper um obrigada especial, pois muito vem fazendo por generosidade e iniciativa própria. A cada um dos que acreditaram, um grande abraço, com a certeza de que passarão esta história adiante, para que nunca se esqueça, para que nunca mais aconteça.”

(Documentos Revelados – Do livro: Onde foi que vocês enterraram nossos mortos?, de Aluízio Palmar, 2004)

Sair da versão mobile