O paulistano Edvaldo Santos, de 33 anos quebra as barreiras do preconceito e da comunicação com sua poesia feita em Libras, a Língua Brasileira de Sinais.
Conhecido como Edinho da Poesia, ele é da Cidade Ademar, na periferia da zona sul de São Paulo, mas vive no bairro do Jabaquara com outros três irmãos ouvintes.
Ele é educador e encontrou na poesia uma forma de se comunicar com o mundo. Um jeito de expressar na arte as vivências como negro e surdo em uma sociedade ainda praticamente analfabeta em Libras.
“A arte me mostrou o caminho. Não falo só sobre mim, mas também dos outros surdos, é o que eu vejo na sociedade. O meu poema ‘Mudinho’ é um exemplo disso, os surdos veem e se identificam. Estou criando a minha arte também para falar da comunidade surda, para que eles vejam, para que eles [ouvintes] entendam”, disse à Agência Mural com apoio do intérprete André Rosa.
No ano passado, Edinho chegou a final do Slam BR, a principal competição de poesia falada do Brasil, com a parceira do compositor James Bantu.
“Eu gosto do slam porque é um espaço periférico, se afasta da poética elitista. Estamos falando sobre temas impactam, relevantes”, afirma.
Edinho afirma que sua presença em espaços culturais se torna um ato político. “Entre ser negro e ser surdo, eu acho que o principal ponto é ser negro, sabe”, diz.
História
Aos 13 anos, ele começou a sair sozinho e conhecer grupos de surdos. “Eu ia em vários rolês nas quebradas, trocava ideia, falávamos sobre as nossas vidas, dificuldades e criávamos estratégias. Nós aconselhamos uns aos outros”, disse.
Ele estudou da pré-escola até os 15 anos em uma escola especializada no ensino de pessoas surdas, por meio de bolsa, no Ibirapuera, a cerca de 12 quilômetros de casa.
As atividades culturais desenvolvidas pela escola em convênio ao MAM (Museu de Arte Moderna) de São Paulo, despertaram o primeiro interesse pela arte.
Ele pediu a uma ex-professora para ajudá-lo a trabalhar no MAM como educador, e a partir disso nunca mais parou de fazer arte.
Itaú Cultural
Edinho se apresenta no terceiro fim de semana de cada mês, no Itaú Cultural, na Avenida Paulista, em São Paulo.
“Estou de férias agora, volto depois do mês de janeiro”, disse Edinho em entrevista ao SóNotíciaBoa.
Nas apresentações ele promove vivências para sensibilizar o público em relação à língua e à cultura surdas.
“Nesses encontros, o poeta e educador apresenta performances que, por meio da poesia, unem a arte à Língua Brasileira de Sinais – Olhares Poéticos em Libras [com interpretação em Libras]”, convida o artista no perfil no Instagram.
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Trecho da poesia Mudinho:
“Quando eu era pequeno/ diziam: ‘mudinho, mudinho, mudinho’/
Eu já homem feito e barbado/ e eles: ‘mudinho, mudinho, mudinho/
Me casei, tive filho/ e eles: ‘mudinho, mudinho, mudinho/
Eu envelheci, me cansei, me curvei/ e eles: ‘mudinho, mudinho, mudinho/
Mudinho? Não, meu nome é Edinho, porra”.
Brasil
Segundo dados do último censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), no Brasil, cerca de 9,8 milhões de pessoas possuem deficiência auditiva.
Desses, 2,6 milhões são surdos e 7,2 milhões apresentam dificuldades para ouvir. Entre os que apresentam dificuldade auditiva severa, 15% já nasceram surdos, como é o caso de Edinho.
De acordo com um estudo feito em conjunto do Instituto Locomotiva e a Semana da Acessibilidade Surda, apenas 7% dos surdos completam o ensino superior; 15% concluem o ensino médio; 46% vão até o fundamental e 32% não possuem grau de instrução