PARTE I
A 28 de setembro de 2000, Ariel Sharon, que era na altura líder do maior partido da oposição em Israel – o Likud, que hoje governa o país – entrava no Monte do Templo, ou Temple Mount, em inglês, na Old City de Jerusalém. Estava rodeado por uma multidão de cerca de 1000 polícias israelitas e uma delegação de membros do partido. Esta praça, que é enorme, onde Ariel Sharon chegava é o mais sagrado local de culto para os judeus e o terceiro mais sagrado para os muçulmanos, que lhe dão um outro nome. Chamam-lhe Nobre Santuário, ou Haram al Sharif.
A visita de Ariel Sharon já era notícia ainda antes de acontecer. Na véspera, o chefe do serviço de informações da Autoridade Palestiniana, Jibril Rajoub, alertava para o que aí vinha: “Se – deus queira que não – alguma coisa acontece em Jerusalém, vai espalhar-se pelos territórios e acho que também vai haver uma reação no mundo árabe e no mundo muçulmano”. Rajoub pedia ainda ao governo israelita que prevenisse, e estou a citar, “esta visita provocadora, para evitar um novo massacre de palestinianos”. Mas, para Sharon, eram os palestinianos que provocavam os israelitas.
Ariel Sharon: Eu vim aqui, ao local mais sagrado para o povo judaico, para ver o que aqui se passa e ter o sentimento de como podemos avançar. Não foi uma provocação. A provocação veio do outro lado.
A campanha para as primárias no Likud aproximava-se. Depois da derrota de Netanyahu, em 1999, frente à coligação One Israel, liderada por Ehud Barak, Ariel Sharon queria mostrar a diferença. Em julho desse ano, tinha-se assistido a mais uma ronda de negociações falhadas entre os líderes palestinianos e israelitas, reuniões que tiveram lugar em Camp David, a base militar e casa de campo oficial do presidente dos Estados Unidos da América. Um dos temas em cima da mesa tinha sido o estatuto da Old City, ocupada desde 1967 por Israel. A governação da cidade de Jerusalém era uma das questões pendentes desde a assinatura dos Acordos de Oslo – como contamos no episódio anterior.
No mesmo dia em que Ariel Sharon visitava o Temple Mount, Ehud Barak dava uma entrevista em que assumia a possibilidade de dividir Jerusalém como parte de um acordo para a paz.
Mas para Sharon, isso era impensável, como diria mais tarde nesse dia, em entrevista à CNN.
Ariel Sharon: Não consigo prever uma paz real se não for permitido aos judeus visitar o seu local mais sagrado. No futuro, Judeus irão visitar também o Monte do Tempo, o seu local mais sagrado. Mas há uma coisa que me preocupa: quando vejo o que aconteceu aqui, penso no que poderia acontecer se Jerusalém fosse dividida como [Ehud] Barak concordou em fazer. Quanta força teremos de impor para podermos viver aqui pacificamente?
Desde 1967, quando Israel ocupou toda a cidade de Jerusalém, é a Waqf, uma organização muçulmana, que administra o Temple Mount, ou o Haram al Sharif, apesar das autoridades israelitas deterem a responsabilidade da segurança e poderem decidir quem lá pode entrar. As regras são claras: não-muçulmanos podiam entrar no complexo durante horas específicas, mas não podiam lá rezar. Ou seja, os judeus poderiam rezar no Muro das Lamentações, que é uma das paredes da praça, e que fica do lado de fora.
Mas o Likud, e a maior parte dos políticos da Direita israelita queriam ter o total controle do Temple Mount. Queriam lá poder entrar e rezar quando quisessem assim como, argumentavam, todos os palestinianos podiam visitar todo o país.
Ariel Sharon: Visitar o Monte do Templo é uma coisa normal, tal como qualquer árabe pode visitar qualquer outra parte do país.
Esta afirmação não é verdadeira. Na altura, e apesar do muro da separação ainda não estar construído, havia restrições à circulação de palestinianos em várias cidades, como Hebron, por exemplo ou em qualquer colonato.
Ariel Sharon: Isto é a coisa mais simples e óbvia nas democracias em que vivemos. Por isso, estou seguro que a soberania sobre o Monte do Templo está nas nossas mãos e estará nas nossas mãos no futuro. Isso será o futuro. Nós estamos à procura de paz. Mas paz, para nós, significa segurança. Paz, para nós, significa que qualquer pessoa pode ir a qualquer sítio e visitar o seu local sagrado e rezar lá.
Sharon dizia querer a paz, mas o seu passado mostrava o contrário. O ex-comandante do exército israelita, que George W. Bush descreveria mais tarde como “um homem de paz” foi um dos mais violentos e implacáveis líderes que Israel teve desde a sua criação. Em 1953, líderou as tropas israelitas durante um massacre que matou 69 pessoas e destruiu a vila de Qibya, na Cisjordânia. No mesmo ano, obrigou os seus soldados a abrir fogo sobre um campo de refugiados na Faixa de Gaza, assassinando 15 palestinianos. Em 1982, como Ministro da Defesa, invadiu o Líbano numa operação a que deu o nome “Operação Paz para a Galileia” e durou três anos: morreram cerca de 18 mil pessoas e mais de 30 mil ficaram feridas. Em Fevereiro de 1983, um relatório do governo israelita concluía que, e estou a citar, “[a culpa] deve ser imputada ao Ministro da Defesa por não ter ordenado medidas apropriadas que prevenissem ou reduzissem o perigo de massacre” e “por ter ignorado o perigo de um banho de sangue e [actos de] vingança”. O massacre a que o relatório se refere ocorreu em 1982, no campo de refugiados de Chatila e na vila de Sabra, com a qual fazia fronteira, e matou mais de 2 mil refugiados palestinianos.
Ariel Sharon nunca foi condenado por crimes de guerra. Na realidade, até caiu nas graças do povo israelita, tendo ganho as eleições de 2001 (um ano mais tarde), e sido primeiro ministro durante cinco anos.
Voltamos ao ano 2000 e àquela tarde de setembro. Dado o historial, a ideia de ter Ariel Sharon a entrar no Haram al Sharif (ou Temple Mount) era uma das ações mais simbólicas e provocadores de que alguém se poderia lembrar. E ele sabia-o.
Foram vários os palestinianos que protestaram durante a visita de cerca de uma hora que Sharon fez ao complexo. Incluindo Ahmad Tibi, um dos deputados árabes do Knesset, o parlamento israelita, que disse: ”Este é um homem de sangue” e ”A sua história [de vida] mostra que ele não está interessado na Paz”. E a verdade é que mal Sharon saiu do recinto, os distúrbios começaram: palestinianos atiraram pedras, cadeiras, pneus de borracha e objetos metálicos aos militares israelitas, que responderam, como é habitual, com tiros e gás lacrimogéneo. Até ao dia seguinte, morreram sete palestinianos, 25 soldados ficaram feridos. Começava a Segunda Intifada.
Intifada significa “abanão, agitação”. Popularmente, é o nome que se dá à resposta civil palestiniana contra a ocupação israelita, marcada por uma série consecutiva de grandes protestos e violentos confrontos.
Além do lançamento de pedras e mil e um outros objetos, os palestinianos atiravam rockets e os ataques bombistas suicidas sucederam-se. Os tiros, as granadas de gás lacrimogéneo, e os bombardeamentos israelitas também. Nos primeiros cinco dias, quase 50 palestinianos foram mortos. No mês seguinte, morreram 121. No seguinte, 123. Entre setembro de 2000 e o início de 2005 – período em que se deu a 2.ª Intifada -, 1.300 pessoas israelitas foram mortas. Do lado palestiniano, foram assassinadas 3.300, uma média de duas mortes por dia.
No episódio de hoje, “Palestina, a maioria silenciada”, falamos sobre a resistência Palestiniana: das Intifadas, à luta armada. Do Fatah, ao Hamas. Do BDS à solução de um ou dois Estados. Seja toda a gente bem vinda ao Fumaça. Eu sou a Maria Almeida. Eu sou o Ricardo Esteves Ribeiro.
PARTE II
A Old City de Jerusalém parece um labirinto. As ruas são muito estreitas e parecem não ter fim. Praticamente toda esta zona da cidade é um mercado: vendem-se tapetes, postais, amuletos religiosos, panos tradicionais. Mal se vê o céu, em quase todas as ruas, porque os corredores do mercado estão tapados com panos que protegem as lojas do sol. Os carros não passam — apenas alguns tratores que distribuem o abastecimento do mercado pela manhã. O cheiro a especiarias, fruta fresca e falafel acabado de fazer é inconfundível.
A Old City está confinada mais ou menos dentro de um quilómetro quadrado, rodeada por muros altos e em pedra. Há apenas oito portas, que servem de entrada e saída da cidade. Segundo dados da Terrestrial Jerusalem, viviam aqui, em 2014, aproximadamente 38 mil pessoas. Estavam espalhadas pelos quatro grandes bairros da cidade velha, criados ainda no século XIX: o bairro cristão, com 4.500 residentes, o bairro muçulmano, com 28.000, o bairro arménio onde moram 2.500 e o bairro judeu com cerca de 3.000.
Nenhum dos bairros está delimitado fisicamente e quase nenhum é eticamente homogéneo – excepto o judeu. Em 1967, antes da Guerra dos seis dias, em que Israel ocupou toda a cidade de Jerusalém, viviam no bairro judeu cerca de 6 mil palestinianos, uma clara maioria. Um ano depois, em 1968, o governo israelita expropriou toda a área e, dez anos mais tarde, uma decisão do Supremo Tribunal tornou-o exclusivo para judeus, invocando a simbologia histórica do local para a tradição judaica. Essa sentença expulsou as últimas famílias muçulmanas que por lá viviam.
Já nos bairros cristão, arménio e muçulmano, existem cerca de 1000 colonos israelitas, que vivem em enclaves. Daniel Seidemann, diretor da Terrestrial Jerusalem, que ouvimos no último episódio desta série, explica porquê.
Daniel Seidemann: Eles são motivados ideologicamente a viver dentro do bairro muçulmano, perto do Monte do Templo.
Mas não é só na Old City que existem colonatos em Jerusalém. Centenas de milhares de colonos vivem também em East Jerusalem, que é a zona onde a maior parte dos palestinianos vive. Seja em colonatos criados ilegalmente, seja em enclaves dentro dos bairros de maioria palestiniana.
Daniel Seidemann: Temos os grandes colonatos que foram construídos por Israel depois de 1967. Neve Ya’akov, Pisgat Ze’ev, Ramot, Ramat Shlomo, French Hill, East Talpiyot, Gilo. Para além disso, temos 412 mil israelitas a viver em colonatos. E existem também 2600 israelitas em enclaves dentro de bairros palestinianos.
Segundo Seidemann, esses 2.600 colonos não moram nestes bairros por acaso. Tal como os colonos de que falámos quando estivemos em Hebron, no episódio 3 desta série.
Daniel Seidemann: A maior parte dos residentes de grandes colonatos vão para lá viver porque são bairros bons e um pouco mais baratos que outras áreas em Jerusalém. Se lhe dessem uma oportunidade para viver noutro sítio, viveriam noutro sítio. Os 2600 colonos são motivados pela bíblia para restaurar uma ligação ancestral com áreas que se identificam com a história judaica, e têm aspirações messiânicas, ou acreditam que Israel tem um significado messiânico. Muito parecido com o que os cristãos evangélicos acreditam.
Ricardo Esteves Ribeiro: Hum.
Daniel Seidemann: E eles só viveriam em áreas perto do epicentro. Na Old City e perto do Monte do Templo, Selwan, Sheikh Jarrah. Esse tipo de áreas, a Old City e as áreas de onde ela se vê. Muito poucos fora dessa área.
Assim, é normal ver casas de colonos no meio de bairros palestinianos onde, das suas janelas, consigam ver o Temple Mount.
PARTE III
Maria Almeida: Podemos visitar a mesquita?
Baghgat: Sim, podes visitá-la pela janela. Eu posso mostrar-te tudo no meu iPhone.
Baghgat, um guia turístico palestiniano, mostra-nos o interior da mesquita de Al-Aqsa através das fotografias que guarda no seu telemóvel. E é assim que faz as visitas com as dezenas de turistas com quem fala diariamente.
Estávamos no epicentro da Segunda Intifada: no Haram al-Sharif, como dizem os Muçulmanos, ou Temple Mount, como dizem os judeus. É aqui que estão localizados dois dos mais importantes templos do Islão: a mesquita de Al-Aqsa, al-Aqsa mosque, em inglês, e o santuário da Cúpula da Rocha, Dome of the Rock, em inglês.
Enquanto Baghgat explica à Maria porque não podemos entrar com ele no local, eu tento perceber como se escreve corretamente o seu nome.
Baghgat: Não, não se pode entrar, senhora. Nós temos tudo aqui. Veja a mesquita; debaixo da terra; a antiga mesquita Al Aqsa subterrada; vejam, amigos, aqui é para mulheres e aqui para homens; vejam aqui a mesquita; um pilar de Itália; isto é dentro da pedra. Isto é por segurança, amigos. É político, e também por segurança. Antes, podíamos entrar, mas…
Ricardo Esteves Ribeiro: Quando?
Baghgat: No ano de 2000, amigo. Sharon, Arafat. Por questões políticas e de segurança.
Ricardo Esteves Ribeiro: Então só muçulmanos podem entrar?
Baghgat: É isso, amigo. Os muçulmanos não proibiram ninguém de ir à igreja, à sinagoga, à mesquita. Foi uma decisão política.
A decisão foi política. Desde o início da Segunda Intifada, em 2000, que a Waqf, a organização que gere o complexo, deixou de permitir que não-muçulmanos entrassem nos edifícios sagrados. Só com raras autorizações especiais isso acontece. Daniel Seideman, judeu israelita, não tem problemas em ir à Al-Qibli, outro nome, em árabe, chamado à mesquita de Al-Aqsa.
Ricardo Esteves Ribeiro: Mas não se pode entrar na Cúpula da Rocha na Al-Qilibi.
Daniel Seidemann: Eu posso, mas tu não podes.
Ricardo Esteves Ribeiro: Porquê?
Daniel Seidemann: Porque eles gostam de mim.
Ricardo Esteves Ribeiro: E porque é que eles não gostam de mim?
Daniel Seidemann: Porque… bem, não é uma questão de gostar. Uma das coisas que tem acontecido em Jerusalém é uma radicalização religiosa dos judeus, cristãos e muçulmanos. E parte deles têm excluído. Todo o complexo Haram al-Sharif é aberto a não-muçulmanos durante os horários de visita. No passado, as mesquitas também estavam abertas a não-muçulmanos. Hoje, convidados especiais são admitidos, mas o resto do público não, não são suficientemente muçulmanos.
Ricardo Esteves Ribeiro: Isso mudou recentemente? E quem mudou isso?
Daniel Seidemann: Basicamente, isso emergiu, acho eu, depois da Segunda Intifada, quando o complexo foi fechado a visitantes judeus durante algum tempo.
Quem não é muçulmano pode, ainda assim, entrar no complexo, desde que não faça demonstrações de adoração a outras religiões. Mas nem todos os muçulmanos podem lá entrar. Foi também a partir da Segunda Intifada que o muro da separação começou a ser construído por Israel (que explicámos no segundo episódio desta série), o que deixa de fora de Jerusalém milhões de palestinianos muçulmanos. Também os palestinianos que vivem em Jerusalém têm visto as restrições no acesso ao complexo aumentar e diminuir ao longo do tempo, uma vez que quem gere os complexo são os muçulmanos, mas quem gere o acesso ao complexo são os israelitas.
A 14 de Julho de 2017, sexta-feira, dois meses antes da nossa viagem, três palestinianos mataram a tiro dois agentes da polícia israelita perto de uma das entradas do Haram al Sharif (ou Temple Mount), antes de serem mortos, também a tiro, pela polícia, já dentro do complexo.
Ainda nesse dia, as autoridades israelitas vedaram a entrada no Haram al Sharif por razões de segurança – era a primeira vez que isto acontecia, desde 1969. Dois dias depois, no domingo, o complexo abriu gradualmente, mas as forças israelitas tinham instalado detetores de metais e torniquetes à entrada. Centenas de palestinianos foram para as ruas. Protestavam contra a humilhação de terem de ser revistados ou passar por detetores de metais para poder rezar e alertavam para o facto de esta ser, segundo diziam, uma estratégia do governo israelita para mudar a realidade no terreno, e passar a controlar os templos muçulmanos. Por isso, recusavam-se a entrar no complexo enquanto os detetores de metais lá estivessem e rezavam na parte de fora, às dezenas e centenas.
Nos dias que se seguiram, centenas de palestinianos ficaram feridos em confrontos com a polícia israelita e três foram mortos. A violência aumentou ainda mais quando um vídeo, revelado a 21 de Julho, mostrava um soldado israelita a pontapear um palestiniano que rezava, no chão.
Nesse dia, num comunicado da polícia israelita lia-se: “A entrada na Old City e no Monte do Templo será limitada a homens maiores de 50 anos. Permite-se a entrada a mulheres de todas as idades”. Três mil agentes das forças de segurança e exército foram enviados para a Old City. Noutros locais da Palestina, em protestos contra as novas medidas, mais três palestinianos morreram e cerca de 400 ficaram feridos.
Mais tarde, perante a reação palestiniana, Israel anunciou que trocaria os detetores de metais por câmeras de vigilância. Ainda assim, os protestos continuaram até que, passado uns dias, as medidas de segurança começaram a ser removidas. Muçulmanas e muçulmanos voltaram, então, à mesquita de Al-Aqsa mas, à chegada, foram recebidos com gás lacrimogéneo e bombas de atordoamento; 100 ficaram feridos. Para alguns, começaria aqui o que chamam de Terceira Intifada.
Ilan Pappé, historiador israelita e autor de “The Ethnic Cleansing of Palestine”, falou connosco em Lisboa, em maio passado, sobre isso:
Ilan Pappé: Eu acho que estamos já numa terceira Intifada. Como historiador, posso dizer-te que tentamos sempre perceber um evento de acordo com os parâmetros do evento anterior. Estamos a tentar entender uma terceira Intifada com base no sabemos sobre a primeira e a segunda. Não vai ser como a primeira e não vai ser como a segunda. Talvez seja um processo mais longo do que as Intifadas anteriores. Talvez tenha longos períodos de inatividade. Mas quando um historiador olhar para trás, para os anos de 2017 a 2027, talvez falem sobre uma década de terceira Intifada.
Ben Ehrenreich: Não, não concordo com isso. Gostava de poder concordar, mas não.
Este é Ben Ehrenreich, jornalista americano e autor de “The way to the spring, life and death in Palestine”. Falámos com ele por telemóvel, em Junho deste ano.
Ben Ehrenreich: A palavra “Intifada” tem de ser usada não com cuidado, mas com especificidade. A primeira e segunda Intifadas foram revoltas em massa. As duas, pelo menos começaram como revoltas em massa fora do poder de qualquer facção política.
E a grande diferença, diz, é que estes não são protestos em massa, mas sim pontuais.
Ben Ehrenreich: Começámos a ver estes ataque individuais a soldados israelitas e forças de segurança. E o que aconteceu em Gaza esta primavera, acho, foi a massificação de uma profunda frustração, mas não se espalhou para a Cisjordânia, nem para Jerusalém. Existiram pequenos protestos, como sempre existem, mas não foi o tipo de revolta massificada que vimos na primeira e segunda Intifadas. Acho que observadores estão constantemente à espera de uma nova Intifada e a tentar dizer que uma Intifada chegou. Mas eu não acho que isso seja o que estamos a assistir, de todo. Estamos a assistir a uma situação muito mais complexa e difícil.
Mas, segundo Ben, a razão por que não rebenta uma nova Intifada há mais de uma década não tem que ver com Israel, mas sim com o papel que a Autoridade Palestiniana, Palestinian Authority (ou PA), em inglês, tem desempenhado.
Ben Ehrenreich: Nas últimas semanas existiram grandes manifestações contra a PA [Palestinian Authority] em Ramallah que foram reprimidas brutalmente. Quando a PA reprime manifestações, usa as mesmas táticas que usam os israelitas. Às vezes, até usam as mesmas munições. Tendo estado no final de protestos que foram reprimidos pela PA, as pessoas agarram nas latas de gás lacrimogéneo e reparam que os invólucros são israelitas. Estive em protestos em Ramallah onde jovens marchavam em direção a um colonato e a uma base militar à saída de Ramallah. É um local de confrontos frequentes porque é um dos colonatos até onde se pode ir a pé. Os jovens têm tentado marchar até à base militar para desafiar as forças da ocupação e a PA coloca-se no caminho. Eles acabam por ser espancados e presos e dispersados pelas forças da PA. Isto é uma maneira muito direta como a PA age como a força avançada da ocupação em termos de reprimir a resistência. Não é metafórico, não é assim tão complexo. É muito fácil de assistir a isso. Quando alguém quer realmente desafiar as forças da ocupação, a PA é das primeiras a estar lá para garantir que isso não acontece.
Todos os palestinianos com quem falámos durante os 10 dias em que estivemos de viagem nos disseram o mesmo: “A PA perpetua a ocupação”. Hisham Sharabati foi um deles, investigador na Al-Haq e coordenador do Hebron Defense Committee, com quem falámos em Hebron.
Hisham Sharabati: Com o passar dos anos desde o processo de Oslo, a ocupação tornou-se um facto, e a PA começou a ser parte dela, normalizando-se com a ocupação, em vez de ser um projeto para o fim da ocupação.
Foi com os acordos de Oslo, em 1993, que a Palestinian Authority foi criada. Como um governo interino, para cinco anos. Uma administração transitória até que um acordo de paz permanente fosse conseguido. Até hoje.
Hisham Sharabati: Todos os encargos que as autoridades israelitas tinham enquanto poder ocupante, mandaram-nos para cima da Autoridade Palestiniana, como o sistema de educação e o sistema de saúde, que costumavam ser geridos pela ocupação. A Autoridade Palestiniana não tem muitos recursos e têm dinheiro da comunidade internacional. Então, a comunidade internacional, na verdade, paga a ocupação. No passado, era responsabilidade as autoridades israelitas gerir o nosso sistema de educação, o nosso sistema de saúde, etc.
Para Israel, tudo ficou mais fácil. Uri Zaki, israelita, dirigente do partido Meretz, que ouvimos no último episódio, concorda.
Uri Zaki: Antes de Oslo, tínhamos [Israel] que gerir os palestinianos diretamente. Recolher o lixo, dar educação…
Ricardo Esteves Ribeiro: O que os palestinianos dizem é que a PA não recolhe o lixo, não gere a educação.
Uri Zaki: Eles fazem isso por nós! Costumo dizer que são subcontratados de muitas formas. O regime de Oslo em que vivemos agora, era suposto ser um acordo temporário de cinco anos e era suposto acabar em maio de 1999. E para um acordo para cinco anos, talvez até fosse razoável. Mas estamos agora a viver 20 anos depois da data de fim do acordo temporário.
O direito internacional confere a Israel a obrigação de garantir que necessidades básicas estão garantidas nos territórios ocupados, enquanto os ocupa. Por exemplo, o artigo 56º da Quarta Convenção de Genebra – “Convenção para a proteção das pessoas civis em tempo de guerra” – que outorga proteção a civis, inclusive em território ocupado, diz: “Com todos os meios que lhe estão ao dispor, o poder ocupante tem o dever de assegurar e manter, com a cooperação de autoridades nacionais e locais, dos estabelecimentos hospitalares e serviços médicos, a saúde pública e a higiene no território ocupado (…)”. Com os acordos de Oslo, Israel transferiu esta e outras responsabilidades para a PA.
Uri Zaki: Então Israel não tem de ter nenhum orçamento para governar os palestinianos, o que antes tinha de fazer. Seria um encargo para o orçamento de Israel que agora já não tem, ainda que controle totalmente toda a Cisjordânia.
Com o passar dos anos, a Palestinian Authority foi ganhando vícios e os escândalos de corrupção foram se acumulando. Mas uma coisa mantém-se: o apoio dos contribuidores internacionais. Hisham Sharabati, explica:
Hisham Sharabati: É verdade. As pessoas pobres recebem muito pouco, mas as pessoas ricas que recebem a maior parte do dinheiro. São essas pessoas ricas controlam o país, e elas querem que o país esteja sempre quieto, para que continuem a receber projetos. Todos estes investidores estão a investir no chamado processo de paz e estabilidade. Se os palestinianos começarem uma Intifada, por exemplo, poderíamos receber sanções, o que significaria que todas essas pessoas iriam deixar de receber dinheiro, ou receberiam muito menos. Então, isso ameaça os seus interesses. Eles têm o interesse de deixar a situação como está, muito quieta. Eles dizem que se opõem à ocupação e que querem mais liberdades, e tal, mas, infelizmente, a visão de liberdade deles é o que lhes dá mais controlo, mais benefícios, e não o que acaba com a ocupação. E é por isso que temos as forças de segurança palestinianas a reprimir a resistência palestiniana à ocupação. Não só a resistência armada, mas também a resistência não violenta.
Para Uri Zaki, a solução passa por acabar com a PA.
Uri Zaki: Se me perguntas (e eu escrevi isto antes), se eu fosse a Palestinian Authority, desmantelaria a PA eu próprio. A PA está a criar uma ocupação de luxo para Israel. É um tampão. É muito fácil de dizer e muito difícil de fazer, claro, porque para os palestinianos serve o propósito de um mecanismo para um futuro Estado, etc. Mas é um espantalho político e diplomático: ‘nós somos iguais’. Em vez de uma situação em que temos um ocupante e um ocupado, temos uma disputa entre duas nações.
Ricardo Esteves Ribeiro: Um conflito?
Uri Zaki: Sim! Sabes, ‘há um conflito aqui, um conflito ali’. Não sei, talvez o Chipre… não é como o Chipre! Não é. É uma ocupação. Este povo vive sob a única ocupação que conheço na atualidade.
Shahd Wadi, palestiniana e portuguesa, doutorada em estudos feministas pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e assessora de imprensa na Missão Diplomática da Palestina, em Portugal:
Shahd Wadi: Há uma coisa que estão sempre a dizer é ‘um conflito, um conflito’. Para haver um conflito, tem de haver duas forças iguais. Duas forças com armas. Mas não há. Há um ocupado, ocupante. Opressor, oprimido. Como é que há um conflito?
PARTE IV
25 de Janeiro de 2006. O partido palestiniano Hamas ganhava as segundas eleições legislativas de sempre para o Conselho Legislativo Palestiniano, o Parlamento da Autoridade Palestiniana, numa votação em que participou 77% da população, segundo observadores internacionais. Com 74 membros, em 132, o Hamas ficou com a maioria, que antes pertencia à Fatah. A Fatah, fundada por Yasser Arafat, é o partido de Mahmoud Abbas, atual presidente da Autoridade Palestiniana, e só elegeu 45 lugares, ficando em segundo lugar nas votações.
Para acompanhar a campanha eleitoral e as eleições, a União Europeia enviou 185 observadores ao local, de 23 Estados Membros e também da Noruega, Suíça e Roménia, numa Missão de Observação. No dia seguinte, o relatório preliminar destacava: “Eleições parlamentares abertas e bem organizadas fortalecem o compromisso palestiniano para com as instituições democráticas” e, lia-se: “As votações a 25 de janeiro decorreram com calma e normalidade, com uma impressionante participação de 77 por cento do número total de eleitores registados”. O National Democratic Institute for International Affairs, uma ONG americana, tinha tido também uma equipa no local, e a sua delegação escrevia nas conclusões: “(…) com exceção dos limites impostos ao número de eleitores autorizados a votar em Jerusalém Oriental, nenhuma das falhas acima citadas teve impacto significativo nos resultados. Como tal, deve considerar-se que o resultado reflete a vontade das pessoas”.
A vontade do povo era que o Hamas os representasse. Mas essa não era vontade de quem manda.
Ainda antes das eleições, Israel deteve membros do partido e candidatos às votações. Depois das eleições a purga continuou. No total, Israel deteve 33 membros do recém eleito parlamento, 25% de todos os deputados do Hamas. O ex-presidente americano Jimmy Carter dizia: “Estes homens são culpados de nada mais do que ganharem um assento parlamentar numas eleições abertas e honestas (…)”.
No dia seguinte às eleições, George W. Bush falou aos jornalistas, na Casa Branca:
George W. Bush: Vêem, quando damos às pessoas o voto, damos também a oportunidade de se expressarem nas urnas. E se elas estiverem infelizes com o status quo, vão mostrar-nos. É uma coisa muito boa da democracia. Proporciona um olhar sobre a sociedade.
Os palestinianos tinham-se pronunciado claramente. Faltava que os Estados Unidos o fizessem.
Jornalista: Isto vai afetar a ajuda monetária aos palestinianos? Conseguirão trabalhar com o Hamas?
George W. Bush: Bem, eu deixei bem claro que os Estados Unidos não iriam apoiar partidos políticos que queiram destruir o nosso aliado Israel. As pessoas têm de renunciar a esta parte da plataforma.
Não foi preciso esperar mais do que uma semana para que Condoleezza Rice anunciasse: “Os Estados Unidos não estão preparados para financiar uma organização que promove a destruição de Israel, que promove a violência e que recusa as suas obrigações”. Assim, deixariam de contribuir com ajuda monetária para a Palestina. Desde 1993 até esta altura, o governo norte-americano tinha dado mais de 1,5 mil milhões de dólares, em ajuda internacional, uma parte diretamente à Autoridade Palestiniana.
Também Israel cortaria com as transferência monetárias mensais de impostos coletados em nome do governo palestiniano. Mas os Estados Unidos foram mais longe. Um trabalho de investigação de David Rose, publicado na revista Vanity Fair, em 2008 – dois anos depois de tudo isto ter acontecido – com o título “The Gaza Bombshell”, revelava, através de uma série de documentos confidenciais, que a administração de Bush e de Abbas tinham um plano secreto para a instigação de uma guerra civil na Palestina, com o objetivo de retirar o Hamas do mapa. Os documentos, entretanto confirmados pelos Estados Unidos e pela Autoridade Palestiniana, estimavam a empreitada em 1.27 mil milhões de dólares para, e citando o documento: “Fornecer ao pessoal de segurança as armas e o equipamento necessários para executarem as suas missões”, pagar a “batalhões altamente treinados em policiamento forte” e ainda “treino especializado no estrangeiro”, na Jordânia ou Egipto. O plano tinha o nome “Plano B”.
Passaram-se meses de negociação entre o Hamas e a Fatah, com o objetivo de criar um governo de unidade nacional. A 17 de março de 2007, um ano depois das eleições – Ismail Haniyeh tomou posse, mas foi imediatamente recusado por Israel e pela comunidade internacional, por não concordar em reconhecer Israel como um Estado e renunciar à violência.
Seguiu-se, em junho desse ano, o que ficou conhecido como a “Batalha de Gaza”.
Aqui, palestinianos do Hamas pegaram em armas contra palestinianos da Fatah. O Hamas tomou conta da Faixa de Gaza e expulsou todos os políticos da Fatah da região, separando-a politicamente da Cisjordânia. Pelo menos 100 pessoas morreram nos confrontos, centenas ficaram feridas.
Em 2010, a Wikileaks revelou uma comunicação de Yuval Diskin, chefe de um dos serviços de informações de Israel, enviada em 2007, exatamente quando a “Batalha de Gaza” se dava, revelando que Abbas lhe pediu ajuda para atacar o Hamas. Citando, “Eles entendem que a segurança de Israel é central à sua sobrevivência na luta com o Hamas na Cisjordânia” e ainda “Eles estão a aproximar-se de uma situação de soma zero e no entanto pedem-nos para atacarmos o Hamas. Este é um novo desenvolvimento. Nunca vimos isto antes. Eles estão desesperados”.
Abbas demitiu o governo recém eleito e apontou como líder de um governo de emergência Salam Fayaad, cujo partido tinha tido apenas 1,5% dos votos nas últimas eleições, dois lugares no Parlamento. Três dias depois da decisão de Abbas, o embargo à ajuda humanitária que os Estados Unidos da América tinham imposto foi levantado.
Desde 2006, nunca mais houve eleições legislativas ou presidenciais na Palestina. Hoje, é governada pelo mesmo presidente de há 12 anos, cujo mandato expirou há oito, e por um primeiro-ministro em quem quase ninguém votou para deputado.
PARTE V
Tudo isto aconteceu porque o Hamas é considerado uma organização terrorista por vários países do mundo, incluindo os Estados Unidos, a União Europeia e, claro, Israel.
Mas afinal, o que significa terrorismo?
O termo “terrorismo” era, até à segunda metade do século XX, uma palavra muito pouco utilizada. Segundo o Ngram, um projeto da Google que analisa os cerca de 25 milhões de livros que a Google books tem digitalizados e mostra a frequência de uso de uma certa palavra ao longo do tempo, foi a partir dos anos 60 que a palavra terrorismo e terrorism (em inglês) passaram a ser mais utilizadas.
Foi também nesta altura que movimentos independentistas e anti-coloniais começaram a ser definidos como terroristas. Exemplos disso são a ETA, no País Basco; o Irish Republican Army, na Irlanda; a Front de libération du Québec ou mesmo o African National Congress, na África do Sul, o partido de Nelson Mandela, que mais tarde ganhou o prémio Nobel da Paz.
Em Portugal, foi também durante os anos 60 e 70 que a palavra terrorismo começou a ser mais usada. A Fevereiro de 1965, António de Oliveira Salazar, Chefe de Governo do Estado Novo, discursou na tomada de posse da Comissão Executiva da União Nacional, e falou sobre os grupos de ativistas que, durante as Lutas de Libertação Nacional africanas, lutavam contra o colonialismo português:
António de Oliveira Salazar: Eu responderei que o terrorismo que somos obrigados a combater não é a explosão do sentimento de povos que, não, fazendo parte de uma nação, conscientemente aspirem à independência, mas tão-só de elementos subversivos, estranhos na sua generalidade aos territórios, pagos por potências estrangeiras, para fins da sua própria política.
A FRELIMO, em Moçambique; o PAIGC, na Guiné Bissau; a FNLA, o MPLA e a UNITA, em Angola. Todas foram, no seu tempo, consideradas organizações terroristas.
O mesmo aconteceu com a Fatah (na altura chamada Palestine Liberation Organization, ou PLO, liderada por Yasser Afarat, que mais tarde ganhou o Prémio Nobel),que foi considerada uma organização terrorista até aos anos 90.
A discussão sobre o que é ou não terrorismo tem especial importância hoje quando ser considerado “terrorista”, parece estar diretamente ligado com a religião em que se acredita. Um estudo publicado em abril deste ano pela Universidade de Alabama mostra que os ataques terroristas realizados por organizações ou pessoas autodenominadas muçulmanas tem 357% mais cobertura mediática do que outros.
Mas para o dicionário da Priberam, a palavra terrorismo, significa: “Uso deliberado de violência, mortal ou não, contra instituições ou pessoas, como forma de intimidação e tentativa de manipulação com fins políticos, ideológicos ou religiosos”.
Independentemente da definição que cada pessoa tiver para a palavra terrorismo, importa perceber que, para as Nações Unidas, a luta armada é uma forma de legítima defesa contra o poder colonial. Em Novembro de 1982, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou uma resolução onde se lê: “A Assembleia Geral (…) condena fortemente os governos que não reconheçam o direito à autodeterminação e independência de todos os povos sob dominação colonial e estrangeira e subjugação externa, nomeadamente os povos de África e o povo palestiano;” e ainda “A Assembleia Geral (…) reafirma a legitimidade da luta dos povos pela independência, integridade territorial, unidade nacional e libertação da dominação colonial e estrangeira e ocupação estrangeira através de todos os meios disponíveis, incluindo a luta armada;”.
PARTE VI
Falastine Dwikat: Olá.
Ricardo Esteves Ribeiro: Olá! Falastine?
Falastine Dwikat: Sim.
Ricardo Esteves Ribeiro: Como estás?
Falastine Dwikat: Bem vindos. Peço desculpa pelo atraso.
Ricardo Esteves Ribeiro: Não faz mal.
Falastine Dwikat: Olá! Falastine. Prazer em conhecer-te.
Encontrámo-nos com Falastine Dwikat num café lotado, ainda em Ramallah, antes de chegarmos a Jerusalém. O seu nome, Falastine, significa “Palestina”, em árabe. É ativista pelo movimento BDS – boicote, desinvestimento e sanções.
Falastine Dwikat: O BDS é um movimento da sociedade civil que exige o boicote, desinvestimento e sanções a Israel, por causa das violações de direitos humanos que têm sido cometidos contra os palestinianos. O movimento tem três grandes exigências: liberdade, justiça e igualdade. Basicamente, esse é o slogan. Mas as maiores exigências são: o retorno dos refugiados, a igualdade de direitos para cidadãos palestinianos e a demolição do muro, o muro do apartheid.
O BDS foi criado em 2005 e é hoje um movimento não violento que exige à comunidade internacional três coisas: boicotar, desinvestir e sancionar Israel e empresas que são cúmplices com as violações de direitos humanos praticadas por Israel.
Falastine Dwikat: Exatamente. Boicote, é no sentido de boicotar produtos do colonato israelita e produtos de empresas israelitas que sejam cúmplices de violações de Direitos Humanos. Desinvestimento tem a ver com desinvestir de empresas multinacionais que investem ou têm projetos com o governo israelita ou projetos que são cúmplices com a ocupação. Como a G4S que, basicamente, tem contratos de segurança com prisões israelitas; ou os caminhos de ferro que ligam Jerusalém aos colonatos ilegais. HB, que fornece equipamento para proteger colonatos e o muro. E muito mais, claro. Estamos a exigir a toda a gente no mundo que desinvista o seu dinheiro nessas empresas, para que sejam responsabilizadas e coloquemos pressão para que retirem os seus investimentos, contratos e cumplicidade com a ocupação israelita. Sanções significa impor sanções internacionais a Israel, da mesma maneira que o mundo impôs sanções à África do Sul, e que resultou no final do apartheid. Então, estamos a exigir ao mundo que imponha sanções a Israel por causa das violações de Direitos Humanos palestinianos, até que o apartheid que Israel tem forçado termine.
O BDS é inspirado em movimentos como o Anti-Apartheid, iniciado em 1959 por um grupo de sul africanos a viver no Reino Unido, e que pedia o boicote a produtos sul-africanos como medida para acabar com o apartheid. Julius Nyeree, um dos fundadores do, na altura chamado, “Boycott Movement”, escrevia: “Nós não estamos a pedir-vos, ao povo britânico, nada de especial. Estamos apenas a pedir-vos para retirarem o vosso apoio ao apartheid ao não comprarem produtos sul africanos”.
Três anos depois, em 1962, lia-se na resolução 1761 da Assembleia Geral das Nações Unidas:
[A Assembleia Geral] Requer que os Estados Membros tomem as seguintes medidas (…):
-
- Romper relações diplomáticas com o governo da Rep&u
- Romper relações diplomáticas com o governo da Rep&u