Presidente anunciou em rede social que portarias de controle e rastreamento de armas e munições elaboradas pelos militares teriam que ser revogadas
O general de Brigada do Exército, Eugênio Pacelli Vieira Mota, responsável pelas portarias do Exército para controle de armas e munições revogadas pelo presidente Jair Bolsonaro, afirmou, em carta, que as normas visavam à segurança nacional e não atenderam “interesses pontuais” do setor armamentista. O general, exonerado em abril, ocupava o posto de diretor de Fiscalização de Produtos Controlados, área que tem como atribuição supervisionar a produção e comercialização de armas e munições.
No dia 18 de março, foi publicada a primeira portaria que incomodou o presidente e parte de seus seguidores. No dia 25 de março, a exoneração de Pacelli foi publicada no Diário Oficial – a portaria foi revogada formalmente pelo Exército em meados de abril, um dia depois de Bolsonaro ter anunciado a decisão no Twitter. Também foram suspensas outras duas portarias que tratavam do assunto, mas que haviam sido oficializadas já com Pacelli fora do cargo.
A possível interferência de Bolsonaro na expedição das normas do Exército sobre controle de armas e munições está sob análise do Ministério Público Federal (MPF). Em representação enviada à Procuradoria da República no Distrito Federal (PR-DF), a procuradora-regional da República Raquel Branquinho apontou indícios de que o presidente da República, Jair Bolsonaro, violou a Constituição.
“Ao assim agir, ou seja, ao impedir a edição de normas compatíveis ao ordenamento constitucional e que são necessárias para o exercício da atividade desempenhada pelo Comando do Exército, o senhor presidente da República viola a Constituição Federal, na medida em que impede a proteção eficiente de um bem relevante e imprescindível aos cidadãos brasileiros, que é a segurança pública”, disse a procuradora na representação.
“É fato público e notório que a ausência de condições de controle, rastreabilidade e identificação de armas e munições importadas sob a finalidade de atividades esportivas e de colecionador, dentre outras finalidades, em determinadas situações, escondem verdadeiras organizações criminosas que praticam o contrabando de armamentos e munições e abastecem milícias e outras facções criminosas. A cidade do Rio de Janeiro é a face mais visível dessa ausência de efetivo controle no ingresso de armamento no país”, afirmou a procuradora.
Em sua carta o general fez menção ao conjunto de normas publicado pela sua área em função de diversos decretos presidenciais que tratavam de armas de fogo e munições.
A carta do general foi entregue aos seus subordinados e superiores na sua despedida. O documento foi visto como uma revelação de que as normas foram revogadas porque feriam os interesses dos eleitores do presidente. “… Desculpe-me se por vezes não os atendi em interesses pontuais… Não podia e não podemos: nosso maior compromisso será sempre com a tranquilidade da segurança social e capacidade de mobilização da indústria nacional”, escreveu o general em referência a empresários do setor.
O general Pacelli vinha sofrendo pressões nas redes sociais de grupos armamentistas por conta da publicação das portarias. Clubes de colecionadores, atiradores e caçadores (CACs), além de páginas no Facebook que vendem armas, vinham ironizando a atuação do general por causa das portarias. Esses grupos, segundo investigadores, cobraram para que o presidente interferisse em funções que, por lei, são atribuídas ao Exército.
Pacelli entregou o cargo numa “cerimônia de passagem de posse” a 16 de abril. No dia seguinte, Bolsonaro foi ao Twitter para informar que tinha determinado o cancelamento das portarias elaboradas pelo grupo do general. A ordem do presidente de revogar as normas foi aceita pelo Comando Logístico do Exército (Colog) no dia 18.
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Na carta, Pacelli ressaltou “conquistas” relacionadas à modernização no controle de armamentos durante sua gestão e citou as portarias. “Foram quatro importantes decretos presidenciais a serem normatizados”, afirmou o general. O militar não fez qualquer agradecimento ao seu ex-chefe, o general Laerte de Souza Santos, que assinou a revogação das portarias, por determinação de Bolsonaro. Laerte é chefe do Comando Logístico do Exército, ao qual o setor de Pacelli estava subordinado.
O Centro de Comunicação Social do Exército afirmou que a saída de Pacelli do cargo não tem relação com a publicação das portarias sobre rastreamento. De acordo com o Exército, a reunião do Alto Comando em que as promoções foram definidas ocorreu em fevereiro, antes da edição das normas. Como Pacelli, que já estava no quarto ano como general de brigada, não foi promovido a general de divisão, automaticamente foi transferido para a reserva, segundo o Exército.
Por Hora do Povo