As respostas desencontradas ao avanço do novo coronavírus na América Latina estão escancarando o grau de desarticulação de uma região que não só estava mais unida no passado recente, como também era uma das mais resilientes do mundo ao neoliberalismo. Pode não parecer, mas essas coisas estão relacionadas.
A pandemia do novo coronavírus é um problema de todos e não será controlada em um país independentemente do que aconteça aos demais. Sobretudo quando se trata de países vizinhos, de intenso trânsito transfronteiriço, como é o caso dos países da Tríplice Fronteira (Argentina, Brasil e Paraguai), que sabidamente constitui um corredor migratório utilizado por povos de diferentes nacionalidades. Sem ações coordenadas, fica muito difícil enfrentar a pandemia.
Acontece que os organismos regionais que poderiam fazer esse papel de coordenação, como a Unasul e o Mercosul, foram abandonados ou condenados irrelevância pelos governos que hoje comandam países-chave da região. O Brasil mesmo – enfiado no atoleiro de uma crise sanitária, econômica, social e ambiental sem precedentes –, virou as costas para eles e agora se ressente enormemente de sua ausência. Ao sacrificar os tratados regionais, os governos direitistas não só tornaram nossos países mais submissos aos EUA, como também os condenaram ao isolamento no momento em que mais precisaríamos estar integrados.
A criação da Unasul, em 23 de maio de 2008, mostrou que esses países poderiam enfrentar problemas comuns – como o da atual pandemia da covid-19 – baseados na cooperação Sul-Sul e na coordenação das ações regionais. O Conselho Sul-Americano de Saúde da Unasul (CSS), empenhou-se em construir uma rede de cooperação e assistência técnica entre países da Comunidade Andina e do Mercosul, para enfrentar problemas sanitários como os de agora. Não tivesse sido desmantelado, o CSS poderia estar ajudando a coordenar as ações de contenção do coronavírus nos países da América do Sul. Muitas vidas poderiam ser salvas.
A falta de coordenação regional no enfrentamento do coronavírus chegou ao paroxismo na fronteira trinacional. Por algum motivo não explicado, Itaipu Binacional pretende flexibilizar as medidas de isolamento social recomendadas pela OMS a partir dessa semana, quando o Brasil registra mais de 50 mil mortes pela covid-19. Os casos confirmados da doença na cidade de Foz do Iguaçu também vem aumentando, diferentemente do que acontece no Paraguai, país que tem os menores números de casos confirmados e mortos pelo novo coronavírus.
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O curioso é que, enquanto o lado brasileiro pretende iniciar as medidas de afrouxamento, o lado paraguaio decidiu prorrogá-las sine die. É impossível imaginar tamanho descompasso. Se uma única empresa não é capaz de se entender sobre a melhor forma de combater o coronavírus, o que dizer dos erráticos governantes direitistas que nos colocaram nesse atoleiro. Por falta de integração, seguiremos fragilizados diante da mais grave crise sanitária de nossa história.
Por Renato Martins – Brasil de Fato
Edição: Rodrigo Chagas