A Escola Popular de Agroecologia e Agrofloresta Egídio Brunetto propõe caminhos e metodologias para a Agroecologia
Localizada no Extremo Sul da Bahia, a Escola Popular de Agroecologia e Agrofloresta Egídio Brunetto propõe caminhos e metodologias para a Agroecologia.
Em uma região de Mata Atlântica devastada pelo avanço da monocultura do eucalipto, pastos e plantações de café, famílias Sem Terra têm reescrito a história no Extremo Sul da Bahia. E para criar esta nova perspectiva de vida e esperança, estas famílias experimentam, aprendem e ensinam formas de manejar e recuperar os solos e os agroecossistemas severamente danificados.
Reunindo toda esta sabedoria está a Escola Popular de Agroecologia e Agrofloresta Egídio Brunetto (EPAAEB), centro de formação do MST na região. A construção da escola aconteceu em meio a uma tensão entre modelos de desenvolvimento, onde a escola se torna ferramenta pedagógica dos trabalhadores do campo que estão em um constante processo de luta pelo direito à terra e ao território, conta Dionara Ribeiro, do setor pedagógico da Escola.
“A construção da Egídio Brunetto é desafiante, justamente porque traz em sua essência os desafios da luta pelo acesso à terra, o desafio da formação política e técnica dos assentados e assentadas, e o desafio da construção de tecnologias apropriadas à agricultura camponesa”, afirma Dionara.
Felipe Campelo, também do setor pedagógico da EPAAEB, ressalta o importante espaço de reflexão sobre como os desafios da construção da base agroecológica. “A Egídio Bruneto é uma escola construída a muitas mãos. Falar sobre a escola é lembrar que ela é fruto de uma luta intensa contra a expansão do eucalipto na região do Extremo Sul da Bahia. O MST, percebendo que o modelo do capital estava ocupando as terras, destruindo as árvores, ocupando o território como um todo, fez este enfrentamento que culminou com a conquista de diversos assentamentos e da escola.”
A iniciativa busca estimular nas escolas do campo uma nova forma de viver e conviver no campo e na cidade, respeitando o meio ambiente e incentivando a produção de alimentos saudáveis, para um novo equilíbrio social e ambiental. “A construção da escola é constantemente revisitada; é fruto desta luta e esta luta não pára, portanto, a construção da escola não pára. Ela está em eterna transformação, a partir das nossas necessidades que vão mudando ao longo do tempo”, afirma Felipe
Construindo os cursos de formação
O processo de desenvolvimento dos cursos de formação envolvem reflexões entre os setores do Movimento, a partir de análises da conjuntura e o dever de preservar o meio ambiente. “Um coletivo reflete a necessidade efetiva para que a gente consiga avançar no processo de organização da produção, de construção de bio-insumos, de contenção de pragas e doenças, de forma que a gente possa aumentar a diversidade e a biodiversidade do sistema ecológico. Toda essa análise ajuda a instituir um grupo, que irá formular o método a ser desenvolvido junto com as companheiras e companheiros nas áreas”, conta Felipe.
Dionara também ressalta a coletividade na hora de definir as necessidades concretas dos espaços de formação. “Implantamos arranjos produtivos na escola que dialogam com os assentamentos. É uma forma de avançarmos na produção agroecológica e, ao mesmo tempo, realizar experimentação e fazer a formação com as famílias. Desta maneira, implantamos cursos teóricos e práticos muito baseados na metodologia de camponês a camponês e partir dos princípios da educação popular. Muitas famílias recebem a formação e multiplicam em suas áreas, além de receber um acompanhamento técnico dentro de seus lotes.”
E continua. “Outra tarefa da escola é avançar na formação técnica profissional da juventude. Por isso, em parceria com a secretaria estadual de educação, ofertamos um curso técnico em agroecologia, que também nos ajuda a desenvolver um processo de experimentação e pesquisas a partir das próprias unidades produtivas da escola e também de experiências dos assentamentos, e tem nos possibilitado um avanço no campo da formação e sistematização junto aos estudantes”, lembra Dionara.
Curso Fiocruz
Como exemplo concreto, Felipe traz a perspectiva curricular como resultado de anos de luta do MST, como a campanha contra os agrotóxicos. “Há seis anos, o debate contra os agrotóxicos surgiu da necessidade de perceber quais são os perigos e o que está por trás desses produtos. Foi feito um trabalho nos assentamentos, nas brigadas, mas principalmente nas 52 escolas do campo. E esse processo da campanha dos agrotóxicos acabou sendo incorporado pelas educadoras e educadores do campo, foi ganhando corpo, e acabou culminando na necessidade de aprofundar uma reflexão teórica sobre o tema, como a que tivemos com a Fiocruz.”
Concluído no final de 2020 formando 43 estudantes, a especialização em Agroecologia e Educação do Campo é fruto de uma parceria do MST com a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, vinculada à Fundação Oswaldo Cruz (EPSJV/Fiocruz), um dos mais importantes órgãos de pesquisa e educação em ciência e saúde, como lembra Felipe. “Temos grandes e valorosos companheiros dentro da Fiocruz, que vieram aqui com muita intensidade e envolvimento no processo da educação popular e contribuíram de forma muito qualificada na formação.”
Realizado em cinco etapas, o curso aconteceu durante um ano e meio e culminou com a apresentação de um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) que demandava um plano de intervenção em agroecologia nas escolas do campo. “Era um planejamento mais aprofundado sobre como aprimorar/qualificar o debate da agroecologia e transformar em algo mais concreto dentro dos ambientes escolares e esta relação com as comunidades. Como legado temos estes planos de intervenção, fundamentais para nos ajudar no processo de avanço da agroecologia dentro das nossas escolas”, afirma Felipe.
“A parceria com a EPSJV/Fiocruz tinha como objetivo ofertar uma especialização em educação do campo e agroecologia que buscou sobretudo ampliar a base teórica dos nossos educadores sobre a pedagogia do Movimento e pedagogia socialista, apreendendo elementos essenciais para pensar a escola dos trabalhadores do campo a partir de seu projeto de Reforma Agrária Popular, bem como aprofundar sobre os fundamentos da agroecologia e os desafios de incorporar essa área do conhecimento pensando a escola”, complementa Dionara.
Desafios para o próximo período
Atualmente, a EPAAEB possui papel fundamental na participação e construção de espaços voltados ao avanço da Reforma Agrária e da Agroecologia nos assentamentos da região, e por isso seus desafios se encontram principalmente em processo de desenvolvimento do projeto político pedagógico de ensino. “Estamos vendo uma ofensiva para o fechamento das escolas, e é um grande desafio permanecer com as nossas escolas abertas, funcionando, ser um espaço de resistência camponesa”, explica Felipe sobre as adversidades que enfrentam cotidianamente.
Segundo ele, outro grande desafio é a precarização da qual estas escolas enfrentam por parte das prefeituras. “São professores cujo salários são bem baixos, muitas vezes atrasam vários meses e tem educadoras e educadores que não recebem. Não há transporte escolar, as estradas estão ruins, há falta de estruturas como internet, biblioteca, laboratório. Esta precarização é sentida em nível nacional, e no campo ela é pior. Então há um projeto para que estas escolas do campo sejam destruídas, sejam desmontadas.”
A solução, para Felipe, está em pensar a educação do campo como uma educação integral, que possa realmente compreender os desafios pelos quais passam os camponeses. “É preciso que seja uma escola apropriada às necessidades que os estudantes têm, que são bastante variadas.”
Nesta perspectiva, Dionara aponta que o MST procura atuar no desenvolvimento de formações na área da agroecologia na educação básica buscando, coletivamente com as 52 escolas da região, inserir a agroecologia no currículo escolar. “Apostamos que as novas relações do ser humano com a natureza devem ser abordados desde os primeiros anos de vida, e a escola é um espaço potente para esse trabalho”, conclui Dionara.