Por Marco Roberto de Souza Albuquerque.
Conto com teu desengajamento da campanha dos que, equivocamente, insistem em confundir a população
Colinas do Tocantins, 26 de março de 2021.
Gilberto, meu Irmão caríssimo:
Pax Domini Tecum.
Sou solidário à tua preocupação com o sustento das pessoas e famílias, especialmente dos que (há gerações!) encontram obstáculos estruturais no acesso ao sistema social de oportunidades.
E essa preocupação especial (mas não exclusiva), como sabemos eu e tu, arrima-se no conjunto da Revelação lavrada na Mikrah (Escrituras): trata-se de ocupar-se prioritariamente (mas não exclusivamente) com os ‘Anawîm (os Pobres: Sf 2, 3); e, como sabemos eu e tu, é justamente o empenho prioritário (repito: mas não exclusivo) no atendimento às privações dos socialmente menos favorecidos, que separa os Cabritos das Ovelhas – isto é, distingue entre os que ressuscitarão para a Vida e os que ressuscitarão para a Condenação (Mt 25, 34-40; 41-46).
Portanto, como vejo em ti, não apenas uma pessoa de boa-vontade, senão também um cristão – ou seja, um irmão no seguimento de HaRabbuni, o único a quem eu e tu devemos chamar de Mestre e Senhor (Jo 13, 13) –, exorto-te a não mais militar na disseminação da ideia de que a sociedade, como um todo, e os ‘Anawîm, em particular – devem optar entre sair às ruas para trabalhar ou ficar em casa para prevenir-se.
Convido-te, ao contrário, a participar de uma campanha, penso eu, mais de acordo com nossa orientação espiritual, cujas diretrizes teológico-pastorais se alicerçam na defesa incondicional da Vida. Lutemos, meu irmão, porque os poderes constitucionalmente instituídos garantam a sobrevivência dos trabalhadores e o estímulo aos empresários por meio de um programa emergencial de distribuição de renda e de facilitação de crédito.
Não para sempre, eu e tu sabemos: apenas durante o tempo necessário para, desmobilizando a circulação de pessoas, desacelerar o ritmo de disseminação do SARS-COV2 – ritmo esse, eu e tu sabemos, que já chegou às raias do absurdo; não tardaremos a empilhar (provavelmente daqui sessenta, noventa dias) meio milhão de cadáveres.
Claro está que a eficiência nas medidas de restrição a aglomerações (as quais, dado o atual nível de descontrole na propagação do vírus, talvez exijam até a adoção de um lockdown nacional: quatro semanas, no máximo, desde que feito segundo os devidos paramentos técnico-científicos) – só logra o necessário êxito se acompanhada de outras ações (igualmente respaldadas em orientações técnico-cientificas):
- Testagem em massa: – Para superarmos o absurdo logístico da subnotificação de casos;
- Monitoramento genômico: – Para tomarmos pé da evolução biológica do vírus, isto é, do surgimento, ou não, de variantes;
- Vacinação emergencial e de amplo alcance demográfico: – Para efetivamente debelarmos a proliferação de infecções;
- Combate tecnológico e jurídico à disseminação, nas redes sociais, de mentiras e superstições acerca do tratamento precoce (que não existe: saiba-se de uma vez por todos): Para não mais expormos vidas ao perigo das reações adversas na ingestão de medicamentos que nada mais fazem senão induzir pessoas ao risco de contagiar-se e disseminar o patógeno.
E, para que tudo isso ocorra a contento, faz-se necessário a instauração de uma Comissão nacional com amplos poderes (todos, claro, constitucionalmente embasados). E essa, meu Irmão, deve ser, penso, a mais importante militância neste momento – porque a única, no atual cenário político de atrasos, mancadas e omissões, que me parece capaz de levar a termo a superação (pela implementação das ações apontadas acima) desta que é, pura e simplesmente – a maior crise humanitária da história do Brasil. Simples assim.
Reconhecendo em ti uma pessoa, não só sensata, porém sim dedicada à superação de graves problemas sociais – e tua luta pela preservação da Vida no trânsito dispensa qualquer outra evidência do que afirmo aqui –, conto com teu desengajamento da campanha dos que, equivocamente, insistem em confundir a população, persuadindo-a a crer que, ou saem às ruas para trabalhar, ou ficam em casa para proteger-se – e com teu alistamento na defesa efetiva da Vida: lutemos juntos, e temos o Conselho Diocesano de Leigos da Diocese de Foz do Iguaçu como uma instância favorável para tocarmos uma ação efetiva neste sentido – pela instituição constitucional de uma Comissão nacional que assuma a gestão político-administrativa do atual descalabro humanitários que acomete nosso país.
Agradeço-te a gentileza da atenção. Transmite um caloroso abraço à Lucilene e às crianças.
Despeço-me de ti em Paz e Fraternidade, como deve ser, entre nós, sempre (Jo 15, 12): sente como se trocássemos o ósculo santo (II Co 13, 12).
Shalom Aleichem.
Atenciosamente,
Marco Roberto de Souza Albuquerque.
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